Devido à sua relevância
geopolítica e geoestratégica, interligando o subcontinente indiano ao Mar
Mediterrâneo, seria virtualmente inevitável o spillover da guerra contra o Irã,
deflagrada por Israel com ou sem a participação dos Estados Unidos, devido às
suas implicações religiosas e sectárias. Embora o número de xiitas, entre os
muçulmanos, represente de 10% a 11%, contra mais ou menos 90% de sunitas, eles
constituem a maioria da população do Irã, Azerbaijão, Iraque, Bahrain, minorias
qualitativamente importantes em praticamente todos países do Oriente Médio e
adjacências. Estão concentrados em áreas estrategicamente importantes para o
Irã [1].
Na Arábia Saudita, em uma
população de 19,4 milhões, os xiitas, cerca de 1,5 milhão a 2 milhões de
habitantes, representam cerca 10%, mas estão concentrados em al-Qatif e
al-Awamiyah, na Província Oriental, a mais rica em petróleo, onde representam
1/3 dos moradores e vivem institucionalmente discriminados, nas piores
condições econômicas, proibidos de construir suas mesquitas etc [2]. As tensões
são antigas. Desde 2011, a população xiita começou a protestar, com mais
intensidade, e a insurgir-se, mas as manifestações pacíficas foram reprimidas
brutalmente pelas tropas do rei Abdullah. Tanto nas manifestações de 24 de
novembro de 2011 quanto em 24 de janeiro de 2012, diversos civis, que
protestavam, pacificamente, foram mortos e milhares, presos [3]. E a mídia
internacional nenhuma relevância deu a esses fatos.
Entretanto, os xiitas,
concentrados em al-Qatif e al-Awamiyah, na Província Oriental, configuram um
punhal apontado para o coração petrolífero do país, de onde os Estados Unidos
importam cerca de 12% dos 19 milhões de barris que consumiam, a cada 24 horas,
em 2011 [4]. Nos primeiros meses de 2012, diversas manifestações de protestos
contra a monarquia wahhabista e os Estados Unidos ocorreram ao longo dos portos
da Arábia Saudista, envolvendo Qatif (al-Qatif), Rabiyia (al-Rabeeya) e
Awamiyah (al-Awamia), porto este por onde fluem mais de 2 milhões de barris de
petróleo todos os dias [5].
No caso de guerra contra o Irã,
os xiitas certamente voltariam a rebelar-se e atacar os campos petrolíferos lá
existentes, assim como as instalações dos Estados Unidos e das companhias
norteamericanas, como aconteceu em 25 de junho de 1956, quando um atentado
terrorista explodiu as Khobar Towers, perto da companhia Saudi Aramco, na
cidade de Dhahran, matando 19 soldados e civis americanos. A estabilidade e a
integridade geográfica da Arábia Saudita estariam ameaçadas, inclusive pela
secessão da Província Oriental, região de fundamental importância, não apenas
econômica, mas também geopolítica e estratégica, pois está situada à margem do
Golfo Pérsico e sua capital, Dammam, ligada a Bahrain pela ponte de Manama.
Os xiitas compõem cerca de 70% da
população de Bahrain, estimada (2011) em 1.214.705 habitantes (cerca de 517.368
são trabalhadores estrangeiros) e poderiam, provavelmente, aproveitar as
circunstâncias para também se rebelar contra o regime do emir sunita,
auto-proclamado rei 2002, Hamad bin Isa al Khalifa, como o fizeram em 2011 e
foram sangrentamente reprimidos pelas tropas da Arábia Saudita e dos Emirados
Árabes Unidos, que atravessaram a ponte de Manama sob a égide do Gulf
Cooperation Council (GCC), a fim de sufocar as manifestações e proteger as
“instalações estratégicas” lá existentes. A população xiita vive econômica e
politicamente marginalizada. E suas manifestações, exigindo reformas
democráticas, sob a liderança do clérigo Sheik Isa Qassim, não cessaram,
reproduziram-se em março de 2012, assustando a elite sunita e a monarquia
Wahhabi da Arábia Saudita.
Bahrain é um pequeno país
insular, de 692 km², um arquipélago de trinta e cinco ilhas e ilhotas, no Golfo
Pérsico, mas, embora sua produção atual de petróleo seja diminuta, da ordem
aproximada de 239,900 bbl/d (2009 est.), tem fundamental importância
geopolítica e estratégica para a Arábia Saudita e, principalmente, para os
Estados Unidos. A 5ª Frota está estacionada na base naval de Manama, com 40
navios e 30.000 efetivos, e o aeroporto de Muharaq e a base aérea Sheik Isa são
usados pela Força Aérea americana para as operações no Golgo Pérsico, no Mar
Vermelho, no Mar Árabe e no Estreito de Hormuz. A presença militar dos Estados
Unidos legitima a autocracia sunita da família al Khalifa. E se a maioria xiita
assumir ou assumisse o poder em Bahrain certamente contaria com o respaldo da
população da Província Oriental, que também se insurgiria na Arábia Saudita e
certamente teria o suporte do Iraque e do Irã.
A guerra sectária espraiar-se-ia,
também, ao Líbano, à Jordânia, recrudesceria no Iraque e na Síria, bem como na
Líbia e no Iêmen, e poderia atingiria Qatar, onde os Estados Unidos construíram
instalações do US Central Command (USCENTCOM) e US Army Forces Central Command
(ARCENT), em Sayliyah, aquartelando duas brigadas e mais de 11.000 soldados. Na
Base Aérea de Al Udeid, localizada a oeste de Doha, estão instalados o United
States Central Command (USCC) e United State Air Force Central Command
(USAFCC), bem como hospedada a 379th Air Expeditionary Wing da USAF e No. 83
Expeditionary Air Group RAF. De um modo ou de outro, a guerra sectária afetaria
e envolveria as tropas dos Estados Unidos, dado que há décadas apóiam Israel e
os regimes ditatoriais da região, inclusive a monarquia Wahhabi, absolutista e
corrupta, da Arábia Saudita, e o resultado seria o incremento do
anti-americanismo e o maior fortalecimento de al-Qa’ida.
O desastre econômico
Cerca de 64% das reservas
mundiais de petróleo (o Irã é o quarto maior exportador) estão situadas no
Oriente Médio, que supre 70% das necessidades mundiais de petróleo, e a rota do
Golfo Pérsico, atravessando o Estreito de Hormuz, até o Golfo de Oman é vital
para o economia mundial, uma vez que por aí passam 40% do transporte marítimo
global de petróleo e a guerra inevitavelmente interromperia o fluxo de 15 Mb/d
do cru para a Europa e os Estados Unidos, bem para como a China, Japão e Coréia
do Sul, entre outros países. O Estreito de Hormuz seria diretamente afetado e,
em conseqüência, o transporte de óleo, ainda que o Irã não o bloqueasse
militarmente.
Desde o início de 2012, o preço
do petróleo tipo Brent aumentou em cerca de 10% e chegou a US$ 125,98, em
março, devido à instabilidade no Oriente Médio. O Irã exporta 2,5 milhões de
barris de petróleo por dia, e a Opep não tem possibilidade de compensar esse
volume, no caso de um ataque de Israel ao Irã. E a guerra entre os dois países,
além de massacrar, possivelmente, milhares de árabes e israelenses, bem como
norteamericanos, elevaria o preço do gás e do petróleo a um nível inimaginável,
catapultado para uma cifra superior a US$ 250, ou mesmo chegar US$ 500 o
barril, interrompendo o comércio e causando um cataclismo na economia mundial,
já abalada e deprimida, desde 2007-2008, pela crise do sistema financeiro, a
partir do colapso do Lehman Brothers e outras corporações, e não superada nem
nos Estados Unidos nem na Europa, até 2012. Os voláteis mercados financeiros
entrariam em completo pânico, com outro golpe, muito mais profundo, que
atrasaria ainda mais a recuperação do crescimento econômico dos Estados Unidos
e, sobretudo, da União Européia.
O ex-presidente George W. Bush,
em 2003, solicitou US$ 87 bilhões para a reconstrução do Iraque e do
Afeganistão. Entretanto, desde então, os Estados Unidos estão a gastar cerca de
US$ 2 trilhões por ano, nas duas guerras, e menos de 5% do total foi usado para
a reconstrução [6]. Só em 2011, a campanha na Líbia custou para cada
contribuinte norteamericano cerca de US$ 2 milhões por dia [7]. E, ao fim do
ano, os Estados Unidos haviam gastado em torno de US$ 1 bilhão, fornecendo à
OTAN mísseis, aviões de monitoramento, drones e toda sorte de munição para
derrubar o regime de Muammar Kaddafi e levar o país ao caos [8].
Uma conflagração, abrangendo todo
o Oriente Médio, envolveria necessariamente os Estados Unidos, cuja dívida
pública, em 11 de março de 2012, havia alcançado um montante de mais de US$
15,5 trilhões, maior que o PIB, estimado em US$ 15,04 trilhões (2011) [9], e
continuava a crescer cerca de US$ 4,01 bilhão por dia [10]. E seus gastos na
região, que já somam trilhões de dólares, cresceriam de maneira
insuportavelmente esmagadora.
Em 2002, o presidente George W.
Bush (2001-2005 e 2005-2009) acusou o Irã de constituir com o Iraque e a Coréia
do Norte o “eixo do mal”. E ordenou que o U.S. Strategic Command, apoiado pela
Força Aérea, elaborasse planos para bombardear o Irã. Porém, dentro do
Pentágono, generais e almirantes advertiram que o bombardeio do Irã
provavelmente não destruiria todas as suas instalações nucleares e poderia
produzir sérias conseqüências econômicas, políticas e militares para os Estados
Unidos [11]. A comunidade de inteligência não havia encontrado evidência
específica de atividades clandestinas ou de instalações ocultas e que os planos
de guerra não eram seguros de acertá-las. E o presidente George W. Bush recuou,
mas atacou o Iraque e o general Collin Powell, então secretário de Estado, até
compareceu à reunião do Conselho de Segurança da ONU, em 6 de fevereiro e em 7
de março de 2003, para provar que Saddam Hussein possuía armas químicas e
nucleares e era necessário urgentemente atacá-lo e derrubar seu regime. O
presidente George W. Bush e o general Collin Powel mentiram. O Iraque não
possuía nenhuma arma nuclear nem química.
Um oficial de alta patente do
Pentágono comentou com o notável jornalista americano Seymour M. Hersh que a
experiência no Iraque fora profundamente falha (deeply flawed) e havia afetado
a avaliação do Irã. E
acrescentou que “we built this big monster with Iraq, and there was nothing
there. This is son of Iraq” [12]. Os Estados Unidos perderam a
credibilidade e, nove anos depois de atacar e invadir o Iraque, onde perderam
cerca de 4.486 soldados, tiveram 33.184 seriamente feridos e mataram entre
106.000 e 115.00 iraquianos [13], o presidente Barack Obama teve de retirar
suas tropas, até 31 de dezembro de 2011, deixando quase todo o país arruinado,
470.000 pessoas vivendo em 382 acampamentos, em áreas inseguras, às quais
faltam empregos e serviços básicos, conforme os dados da United Nations High
Commissioner for Refugees (UNHCR) [14]. E ainda cerca de um milhão de
iraquianos estão deslocados, por diversas regiões, e milhares vivem em
condições miseráveis, incapazes de voltar às suas áreas de origem por causa da
insegurança da situação ou da destruição de seus lares e falta de serviços
básicos [15].
A situação no Afeganistão, de
onde os Estados Unidos e seus aliados da OTAN estavam a planejar a retirada as
tropas até o fim de 2014, não é muito diferente. Em março de 2012, o país
continuava inseguro, em meio à uma situação econômica e politicamente instável,
com um governo corrupto e incompetente, com graves problemas sociais - 1/3 da
população desnutrida, menos de 1/4 com água limpa, desemprego- e 2,7 milhões de
afegãos refugiados na região e cerca de 3 milhões no resto do mundo [16]. As
forças dos Estados Unidos/OTAN haviam destruído casas, culturas e
infra-estruturas e prosseguia o deslocamento de pessoas, cerca de 350.000,
dentro do Afeganistão.
Em 16 de outubro de 2011, o
ministro da Agricultura, Mohammad Asif Rahimi, revelou que mais de 30% da
população afegã vivia abaixo da linha de pobreza e que era necessário investir
na agricultura cerca de US% 1 bilhão por ano para evitar a crise de fome [17].
Dez anos de ocupação pelas tropas dos Estados Undos/OTAN fizeram do Afeganistão
um dos países mais pobres, instáveis e inseguros do mundo [18].
Conforme o relatório “Costs of
War”, preparado por acadêmicos, participantes do Eisenhower Research Project do
Watson Institute for International Studies, da Brown University, as guerras no
Afeganistão, Iraque e Paquistão, em dez anos, mataram 225.000 pessoas,
incluindo homens e mulheres militares, mercenários das empresas privadas
militares e civis. Só no Afeganistão foram mortos 137.000 civis, e mais 35.600
civis mortos no Paquistão. Até agosto de 2011 haviam morrido 5.998 soldados
americanos, 43.184 foram declarados oficialmente feridos, no Afeganistão e no
Iraque, e 54.592 requereram sair do teatro das Operations Enduring Freedom,
Iraqi Freedom, New Dawn, por motivos médicos. E os custos financeiros
situavam-se entre US$ 3.2 e US$ 4 trilhões, incluindo assistência médica e
auxílio aos que estão ou estarão mutilados. Há muitos outros custos que não
puderam ser quantificados, mas as guerras contra o terror, empreendidas pelos
Estados Unidos, foram quase totalmente financiadas por empréstimos, juros de
US$ 185 bilhões já pagos ou a pagar, e outro US$ 1 trilhão pode aumentar
através de 2020 [19]. Isto significa que de 3% a 4% do custo anual das duas
guerras, no valor total de US$1.27 trilhão, foi financiado com cartão de
crédito, segundo Joseph Lazzaro [20].
Com duas guerras perdidas, no
Iraque e no Afeganistão, do qual ainda busca uma retirada mais ou menos
honrosas para as suas tropas, o presidente Barack Obama parece consciente do
problema tanto econômico quanto militar. E não quer fazer uma aventura,
especialmente em um ano eleitoral, embora não se possa desconsiderar o grau de
“instabilidade e imaturidade” da opinião pública, nos Estados Unidos, i.e., do
“seu potencial de histeria” conforme observou, há alguns anos passados, o
inesquecível cientista político americano Brady Tyson [21]. A comunidade de
inteligência dos Estados Unidos não está convencida de que o Irã pretenda
realmente construir armas nucleares e a National Intelligence Estimate (NIE) de
2011 confirmou as conclusões de 2007 e 2010, segundo as quais o programa o
programa foi paralisado desde 2003 [22]. Contudo, não descartou a possibilidade
de que seja capaz de produzir bastante urânio enriquecido (HEU), que tanto
serve para uso civil (geração de energia nuclear), quanto para uso militar
(produção de armas atômicas).
O general James R. Clapper Jr.,
diretor da National Intelligence dos Estados Unidos, declarou que os
especialistas americanos crêem que o Irã está a preservar a opção de produzir
armamento nuclear, contudo não havia nenhuma evidência de que tomara essa
decisão ou estivesse disposto a levar adiante esse propósito. O general David
H. Petraeus, diretor da CIA, bem como o secretário de Defesa, Leon E. Panetta,
e o general Martin E. Dempsey, chefe do Estado Maior Conjunto das Forças
Armadas, fizeram a mesma avaliação em suas entrevistas na televisão [23]. E o
Ayatollah Ali Khamenei, líder dos (principistas), que venceram as eleições para
o Parlamento (Majlis Shora Eslami) de março de 2012, e Supremo Guardião de suas
leis religiosas (Velayat-e Faqih), reiterou que o Irã não estava em busca de
armas “nucleares” e estocá-las é algo “inútil e perigoso” [24].
As contradições em Israel
Mais da metade da população de
Israel é contrária a atacar o Irã, segundo pesquisa divulgada pelo diário
israelense Ha'aretz, e acha que, se fosse necessário, não deveria fazê-lo
sozinho [25]. Mas o governo do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, do Likud,
está estreitamente aliado ao partido Ysrael Beitenu, sob a liderança de Avigdor
Liebermen, ministro dos Assuntos Estrangeiros, de ultra-direita, que passou a
influenciar grande parte da população de Israel. De 1989, com a desintegração
do Bloco Socialista, até 2011, cerca de 1 milhão de russos de origem judaica
haviam emigrado para Israel, passando a constituir 1/6 da população judaica
(cerca de 6 milhões), a maioria dos quais de direita, ainda com a mentalidade
da guerra fria.
Por outro lado, os
ultra-ordotoxos sionistas, fundamentalistas, predominam entre os 350.000 a
400.000 colonos que expandem seus assentamentos na bíblica Judéia e Samaria,
i.e., na Banda Ocidental ou Cisjordânia, os territórios ocupados por Israel na
guerra de 1967. Eles almejam retomar toda a Palestina ou Canaã, a Terra
Prometida, a Terra de Israel (Eretz Yisrael), e influenciam cada vez mais a
IDF. Contudo, conquanto ainda existam 256 Kibbutzim (16 religiosos), com cerca
de 106.000 habitantes e localizados em áreas periféricas, como Arava, o sonho
de Israel como sociedade igualitária já se desvaneceu.
O Adva - 2009-10 Annual Social Report
demonstrou que quase 40% dos israelenses “find it difficult or very difficult
to live on their current income.” [26] O diário Ha’aretz calculou que os
500 israelenses mais ricos possuem um montante US$ 75 bilhões, num país cujo
PIB é de apenas US$ 205 bilhões enquanto as 20 famílias mais ricas controlam
quase a metade do mercado de ações [27]. E a fortuna conjunta desses mais ricos
é 25% maior do que o orçamento de Israel em 2011 [28]. São eles o principal
suporte do governo da coalizão dos partidos Likud-Ysrael Beitenu, de extrema
direita. E as massivas demonstrações de protesto, que culminaram, em setembro
de 2011, com a marcha de 430.000 pessoas (a maior na história de Israel), em
Tel Aviv, evidenciaram que as principais contradições no país não são apenas
étnicas ou religiosas, mas também sociais.
Mais de 60 anos após sua
constituição, Israel apresenta enorme nível de desigualdade, com uma economia
inteiramente dependente dos Estados Unidos, dos quais recebem, desde 1985, US$
3 bilhões por ano [29], a maior parte como ajuda militar, embora não cubra
todas as despesas do orçamento militar, avaliado no mínimo em US$ 13 bilhões
ou, aproximadamente, 7-8% do PIB, um dos mais altos do mundo [30]. O custo dos
Estados Unidos, com a instabilidade no Oriente Médio, cujo epicentro é o
conflito Israel-Palestina, alcançou um total de quase US$ 3 trilhões, em
dólares de 2002, maior do que o custo com a guerra no Vietnã [31].
Tudo indica que a retórica de
Benjamin Netanyahu, ávido por atacar o Irã, seja para pressionar o presidente
Barack Obama a conceder armamentos ainda mais sofisticados e avançados a
Israel, ao competir com os extremistas do Partido Republicano. O presidente
George W. Bush, durante sua administração, recusou-se a vender-lhe bombas de
penetração profunda (bunker-penetrating bombs) e aviões de reabastecimento, em
conseqüência das estimativas de que Israel pudesse usá-los para atacar as
instalações nucleares do Irã [32].
Entretanto, o Prêmio Nobel da
Paz, presidente Barack Obama, atendeu às solicitações do primeiro-ministro
Benjamin Netanyahu e autorizou o secretário de Defesa, Leon Panetta, a negociar
com o ministro de Defesa de Israel, Ehud Barak, a venda de aviões de
reabastecimento e de bombas de penetração profunda (GBU-28 bunker-piercing)
[33]. O Ma’ariv Israeli News Service informou que o fornecimento de tais armas
a Israel visou a um acordo com o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu no
sentido de que ele retardasse o ataque ao Irã até 2013 [34]. Contudo, fontes
políticas de Israel informam que a maioria do gabinete é a favor de um ataque
militar ao Irã, mesmo sem a aprovação dos Estados Unidos e o primeiro-ministro
Benjamin Netanyahu, no Knesset (Parlamento), fez um discurso bem explícito e
resoluto, declarando que não hesitaria em tomar qualquer iniciativa, mesmo sem
o acordo do presidente Barack Obama, e citou como precedente o
primeiro-ministro Menahem Begin (1977–1983), que mandou bombardear o reator do
Iraque, contra a orientação de Washington e a opinião de Yitzhak Hofi, do
Mossad, e Yehoshua Saguy, chefe da inteligência da IDF [35]. E, preparando a
opinião pública para a guerra, acusou o Irã como a “força dominante”, por trás
dos ataques de Gaza, declarando que os “grupos de terror” estão sob o seu
guarda-chuva e que os israelenses poderiam imaginar o que aconteceria se
estivessem armados com bombas nucleares.
Conforme percebeu Aluf Benn,
editor-chefe do diário israelense Ha’aretz, o primeiro-ministro Benjamin
Netanyahu, desde que retornou da visita a Washington, no início de março de
2012, empenhou-se, com um warmonger, em preparar a opinião pública para a
guerra contra o Irã, tentando convencê-la de que a ameaça a Israel é tangível e
existencial e deve ser suprimida para evitar um "second Holocaust"
[36]. Não é crível que o Irã viesse a atacar Israel com ogivas atômicas, se as
produzisse. Um ataque dessa natureza massacraria também a população palestina,
dentro e fora de Israel, e grande parte da população do Líbano. O “second
Holocaust” a que o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu demagogicamente se
referiu não seria somente de judeus, mas igualmente de árabes, cristãos,
muçulmanos (inclusive xiitas), na Palestina e adjacências, bem como de parte da
população do Irã, uma vez que Israel retaliaria da mesma forma.
Entretanto, embora para conter as
pressões do lobby judaico nos Estados Unidos e dos candidatos extremistas do
Partido Republicano, continuasse a afirmar que todas as opções estão sobre a
meses, inclusive o “componente militar”, para impedir que o Irã adquira armas
nucleares, o presidente Barack Obama deseja evitar um confronto armado e
insiste na solução do impasse por meios diplomáticos, em meio ao endurecimento
de sanções e operações encobertas de sabotagem e assassinatos [37], a guerra
nas sombras. Não há alternativa, porquanto, em caso de um ataque aéreo ao Irã,
o cenário será o do Apocalipse, quando o quarto Anjo tocou a trombeta e foram
soltos os quatros Anjos, que estavam acorrentados à beira do Eufrates e se
conservavam para a hora, o dia, o mês e o ano da matança da terça parte dos
homens; eram 200 milhões de soldados e os cavalos, que montavam, encouraçados
com uma chama sulfurosa azul, tinham crina como juba de leão, de suas narinas
saíam fogo, enxofre e fumaça e uma terça parte dos homens foi morta por esses
três flagelos, que lhes saíam das narinas.[38]
(*) Luiz Alberto Moniz Bandeira é
cientista político e historiador, professor titular de história da política
exterior do Brasil (aposentado) da Universidade de Brasília e autor de mais de
20 obras, entre as quais Formação do Império Americano (Da guerra contra a
Espanha à guerra no Iraque).